terça-feira, 18 de novembro de 2014

Banestado e Petrobras: dois atos de uma mesma peça

A deputada federal Iriny Lopes publicou no Facebook um excelente texto sobre a questão da corrupção na Petrobras. O texto é público e vale a pena lê-lo para refletir sobre os processos que conduzem à derrota das oportunidades de combater a corrupção e evitar que isso se repita no caso da Operação Lava Jato, sobre a Petrobrás.
No texto, a deputada Iriny faz uma interessante ligação entre o atual problema da Petrobras e o caso do Banestado, Banco do Estado do Paraná, cujo enredo possui idênticos personagens: o mesmo juiz, o mesmo doleiro e o mesmo Estado do Paraná como origem.
O caso Banestado, ocorrido em meados da década de 1990, foi possivelmente o maior caso de desvio de dinheiro na história do país. Poderosíssimas forças políticas ergueram um muro de contenção para paralisar o andamento das investigações. Ao final, somente peixes miúdos foram responsabilizados. O caso está relatado no livro do Amaury Jr, "A privataria tucana".

A impunidade no caso Banestado incentivou o mesmo sistema criminoso a prosseguir na roubalheira. A história que surge agora, na Petrobras, em menor escala que o do Banestado, é certamente só uma das pontas desse nó até agora inextricável de corrupção. Somente foi evidenciado em decorrência de uma "bobeira" da mídia em sua cruzada contra o governo do PT. A capa da arma chamada Veja, com o famoso "Eles sabiam" que pretendia ser a "bala de prata" contra o PT, voltou-se contra o sistema que operava a arma. Os delegados federais da oposição criaram um monstro que dificilmente poderá ser contido sem a denúncia da blogosfera.
À medida que as investigações avançarem, se avançarem, outros casos surgirão em todos os níveis de governo, federal, estadual e municipal. É muito possível que surjam ligações com o caso Alstom, de São Paulo, e, talvez, com a participação de uma ou outra empresa de comunicação importante.
Esse momento é histórico, podemos estar no limiar de uma mudança ética na política, que depende dos próximos capítulos dessa novela. Como sempre, interesses poderosíssimos, que atuam dentro e fora da estrutura oficial do poder político estatal, estão envolvidas nessas falcatruas. Essas forças certamente estão se movimentando com vigor e farão o possível para impedir o prosseguimento das investigações. No bojo dessas forças, além dos maiores interessados, também estão integrados políticos da oposição e pessoas comuns que se apropriam do discurso da "ética na política contra o PT”.
Tudo será feito sob a fantasia da moralidade e com o apoio da mídia, que continuará a carregar o seu pesado “fardo” de ser propagadora da histeria coletiva ilusória que cega para a verdade. Com esse objetivo em mente, tentarão manipular os fatos para imputar à Dilma os desvios e, quem sabe com isso, alcançar um processo de impeachment que desfocará completamente os objetivos da investigação, livrando pescoços importantes da guilhotina da justiça.
Uma das retóricas prediletas desse grupo é relembrar os casos de corrupção no governo do PT, principalmente nas estatais como a Petrobras, os Correios ou o Banco do Brasil. Claro que não há aprofundamento da questão, pois isso evidenciaria a ausência de sentido dessa grita moralista.
A Presidência de qualquer país exige a descentralização da administração. Não é possível que uma só pessoas gerencie todas as demandas de um país inteiro. Se isso é verdadeiro para um pequeno país, como o Uruguai, muito mais o será para um que possua a complexidade do Brasil, um dos maiores do mundo tanto em território como na economia.
Não é à toa que as estatais integram a chamada Administração Pública Indireta. É indireta porque só reflexamente recebe ingerência do Poder Executivo, que basicamente se limita à nomeação dos presidentes dessas entidades e um ou outro diretor. Após a nomeação, no máximo tais dirigentes recebem diretrizes gerais a seguir, nada mais. Mesmo na Administração Pública Direta, a complexidade da gestão obriga a Presidência a transferir aos ministros e secretários-executivos praticamente a responsabilidade total pela pasta, com encaminhamento de projetos e fiscalização exercidos em reuniões ministeriais.
Por outro lado, a práxis política brasileira exige a repartição do poder através da distribuição de cargos públicos, o famoso e antipático fisiologismo. Dessa prática escusa se beneficiam os partidos que são chamados a compor a base parlamentar, tanto os grandes partidos, como o indefectível PMDB, como os médios e pequenos, como o PTB de Roberto Jefferson que, aliás, foi o partido responsável pela indicação do diretor dos Correios cuja notícia de corrupção deu origem ao processo do mensalão.
Somente uma reforma política que elimine o financiamento privado das campanhas eleitorais, principalmente o que é realizado pelas empresas, porá fim a essa promiscuidade. Com as empresas podendo financiar campanhas, fulmina-se o voto democrático e privilegia-se o voto censitário. Hoje o voto de um empresário vale milhões de vezes mais do que o de um favelado.
É mera ingenuidade ou ferina má-fé atribuir a responsabilidade pela corrupção a quem nomeia o corrupto. Isso é possível, mas não necessário. A distinção entre um bom administrador e um mau administrador se faz notadamente a partir de sua atitude perante a constatação do ilícito praticado pelo inferior hierárquico. O que se via, até o ano de 2002, era o completo acobertamento dos casos. A partir de 2003, percebe-se que as forças institucionais, Polícia, MP e Judiciário, passam a exercer o seu papel constitucional sem amarras.
É fácil, hoje, afirmar que a Polícia Federal apenas cumpre o seu papel e que o PT não é responsável por isso. Todavia, a mudança na conduta desse papel institucional é fácil: bastaria ao dono da caneta exonerar todo e qualquer Ministro da Justiça ou diretor da Polícia Federal que ousasse incomodar. Isso, que sempre foi feito, deixou de representar a normalidade a partir de 2003. O dono da caneta foi Lula é hoje é Dilma. Nenhum dos dois a utilizou para conveniências junto ao Ministério da Justiça, à Polícia Federal ou nas nomeações para o Ministério Público e para o Supremo Tribunal Federal.
Nos piores momentos do mensalão, o que se viu foi a inação do PT em tentar proteger seus dirigentes, ainda que muitos discordassem das conclusões do Procurador Geral e do relator do processo. Por republicanismo, o PT assistiu ícones do partido serem atropelados pela “legalidade”. Havia um projeto maior por detrás dessa atitude. Hoje estamos testemunhando um dos resultados desse projeto.
O problema é que a corrupção é gigantesca, pois nunca foi combatida como deveria ser. Agora que se inicia uma luta mais dura, é claro que se tentará impedir à todo custo a continuidade, inclusive através da repetição da retórica vazia de que "a corrupção é do PT", mantra fulanizadora que serve como uma luva ao propósito de manter tudo como está a partir da criação de uma Geni que sirva de alvo para a indignação popular. Os ingênuos embarcarão facilmente nesse discurso.
A esperança é que Dilma esteja bem amparada por setores institucionais importantes, como as forças armadas e parcela relevante do Congresso e do STF.
O contraponto à grande mídia será absolutamente indispensável a partir de agora, momento em que percebemos que a habitual trégua pós-eleitoral não foi concedida.
Esse contraponto é missão da blogosfera, ou seja, de todos nós na prática da política underground. A divulgação de análises como a da deputada Iriny, e de outras pessoas que realizem o contraponto, é relevante nesse contexto.

A continuidade desse processo de depuração está fundamentalmente em nossas mãos.

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