terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O caso do restaurante paulistano Nonno Paolo

Analisando o caso do restaurante paulistano Nonno Paolo, onde um casal espanhol branco afirma que o filho negro, adotado há dois anos na Etiópia, foi expulso.
Segundo a defesa do estabelecimento, a criança foi confundida com menino de rua.
Racismo é uma coisa terrível. Não há desculpas para o comportamento do dono do restaurante. Sem dúvida alguma houve racismo e preconceito, que precisam ser punidos. Explico porquê.
Primeiro, porque, segundo a notícia, o menino foi expulso, ou pelo gerente, ou pelo próprio dono do estabelecimento, não por algum funcionário subalterno, sem “condições intelectuais” de compreender a exata extensão de sua atitude, como poderia condescender algum racista ou preconceituoso enrustido. Se não é caso de ignorância, não existe como confundir a criança com um pedinte. Trata-se de uma criança filha de turistas espanhóis de classe média, de modo que não estaria vestida como um menino de rua ao comparecer a um restaurante. Disso decorre que, apesar da aparência da criança e apesar dela não estar pedindo esmola, somente pode ter sido confundida com um pedinte por ser negra.
Isso, não há outro nome, é racismo.
Seria mera aleivosia aceitar a tese de que o dono do restaurante agiu em atendimento a um suposto instinto de proteção contra a visão da pobreza, por um inefável sentimento de culpa. Isso, ademais, constituiria puro preconceito.
Além disso, o menino não estava de mesa em mesa pedindo esmola ou comida. Estava sentadinho à mesa aguardando seus pais escolherem a sua comida. Ainda assim foi expulso, sem maiores considerações, apesar de nada falar porque não entendia português.
É muito difícil acreditar que se o menino fosse louro de olhos azuis isso teria acontecido.
E tampouco houve qualquer descuido ou desatenção dos pais por deixá-lo sozinho à mesa sem saber falar uma palavra em português. O menino estava sentado à mesa de um restaurante, aguardando seus pais colocarem a comida em seu prato. Não havia, e não há, porque imaginar que alguém o sequestraria ali, muito menos que algum preposto do restaurante o expulsaria dali, sem mais, nem menos.
Culpar os pais por deixara criança sozinha na mesa de um estabelecimento comercial é como culpar a vítima de estupro com a alegação de que a mulher adotava um comportamento de "oferecida" ou vestia trajes sumários. E de modo nenhum justifica o furto de veículo o fato de ter sido deixada aberta a porta do carro. Seguradoras costumam perder ações na justiça ao alegar tal negligência.
A vítima jamais pode ser culpabilizada pelo comportamento ilícito alheio. Jamais.
Quando se julga alguém com base em convicções íntimas pré-concebidas, sem qualquer elemento de convicção, a isso que se dá o nome de preconceito.
Nesse sentido, tendo o dono do restaurante visto um garoto negro sentado à mesa e imaginado, sem nenhum elemento prévio de convicção, que ele fosse um pedinte, expulsando-o sem tentativa séria de entender a situação, o caso é de racismo.
Não é de preconceito social porque não se imagina que o menino estivesse maltrapilho. O paralelo mental, pois, foi negro-pedinte e não maltrapilho-pedinte.
Esse caso não admite a tese de mal-entendido. Isso porque o proprietário já admitiu que confundiu a criança com um menino de rua. Ou seja, confirma que agiu por preconceito, seja racial, seja social.
Admite-se que uma empresa de fato não tenha que admitir a presença de ninguém em suas dependências que não tenham a intenção de consumir. Porém, antes de expulsar uma criança, pô-la na rua, carregando-a pelos braços, deve ter absoluta certeza de que (a) não se trata do filho de alguém que está no restaurante (caso em que deve permanecer no recinto e não ser expulsa); (b) que, ainda que maltrapilha, não se trata de uma criança que esteja perdida ou em alguma outra dificuldade qualquer (caso em que deve ser auxiliada e tampouco ser expulsa; e (c) que a criança, ainda que maltrapilha, possui perfeita compreensão do que está ocorrendo de modo a poder agir por sua conta (caso contrário, é o caso de encaminhá-la à autoridade competente e não de expulsá-la).
Se a criança não respondeu nada (porque não entendia português), não se poderia pegá-la pelo braço e jogá-la na rua, o que não se permite sequer com um saco de lixo (dá multa).
Como sabemos, pode-se racionalmente defender qualquer tese, por mais esdrúxula que seja, inclusive com coerência lógica. Aliás, os sofistas eram craques nisso. Mas não se pode tapar o sol com a peneira.
O responsável pelo restaurante errou, e errou feio, ao expulsar uma criança de seu recinto sem se certificar do que se tratava.

Deve responder por seu erro.

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