terça-feira, 1 de novembro de 2011

Sobre o movimento “Lula vá pro SUS”

Para aqueles que estão participando desse movimento desmiolado, pretensamente em defesa de que o ex-presidente Lula seja tratado pelo SUS, lamento informar que ele está sendo tratado num hospital, o Sírio Libanês, que também atende pelo SUS. Em outras palavras, ele estaria sendo tratado nesse mesmo hospital se tivesse optado pelo SUS.
As exigências indignadas de tratamento pelo SUS, ou são ingenuidade e desinformação, ou má-fé. Lula poderia perfeitamente estar sendo atendido pelo SUS no mesmo hospital, com a mesma qualidade de tratamento (afinal, trata-se de um ex-presidente). Não sendo pelo SUS, como era direito seu, Lula poupou dinheiro público.
Percebe-se, porém, que o real desejo dos supostos indignados, o que os motiva de fato, não é de que o Lula se trate pelo SUS. A partir do momento que ignoram o fato sabido de que o Sírio Libanês também atende pelo SUS, demonstram que a vontade do grupo que capitaliza a doença do ex-presidente é outra.
É algo inconfessado, vergonhoso.
Pretendem que Lula, como qualquer outro brasileiro normal, que ele é, aguarde na fila para o atendimento.
Vamos esquecer por um momento, em nome da sofística e do casuísmo explícito, que nenhum ex-presidente de qualquer país desenvolvido do mundo, um país cuja economia estivesse entre as dez primeiras do planeta, seria tratada, em caso de doença, como qualquer outra pessoa. Isso não ocorre realmente em lugar algum, mas vamos fechar os olhos e supor que sim.
Admito que a tese é defensável. Por que razão políticos deveriam ter tratamento diferenciado? Deveriam ser atendidos exatamente como o são os cidadãos que representam.
Vamos esquecer a realidade, pois, e analisar o sonho utópico desses indignados.
Primeira objeção: inexistem dados confiáveis que indiquem que, fosse ele atendido pelo SUS no Sírio Libanês, o tratamento seria diferente. Afinal, qual seria o tempo de espera, para o cidadão comum, nesse específico hospital e para esse específico atendimento?
Segunda objeção: porque a exigência dos “indignados” é somente para o Lula? Ele foi o único político a defender o próprio sistema de saúde? O Serra nunca defendeu a saúde de São Paulo? Ou o Aécio a de Minas? O que é isso? Preconceito contra o "inculto" que chegou ao poder?
Darei um testemunho pessoal. Minha filha, recém-saída da adolescência, foi diagnosticada com tuberculose. Moro em Niterói, sou classe média e possuo plano de saúde. Tuberculose, entretanto, é doença somente tratável pelo SUS. Minha filha, assim, foi encaminhada para um posto de saúde municipal.
Ao contrário do que os indignados possam pensar, ela recebeu atendimento, foi examinada e começou tratamento, recebendo os remédios gratuitamente, tudo isso, em menos de quinze dias.
O posto de saúde municipal que a atende é muito eficiente e o atendimento ocorre pelo SUS, repito.
Como se vê, não há qualquer razão para supor que, com Lula, fosse diferente. Aliás, a suposição é contrária. Por ser Lula, o tratamento ainda seria mais célere.
Sendo assim, toda essa indignação é incompreensível, inclusive porque a maior parte do problema do SUS, o atendimento médico ambulatorial e emergencial em si, é problema regional, dos estados ou dos municípios.
A suposta indignação, ao que parece, é apenas uma maneira desumana para demonstração de preconceito e ódio contra Lula.
O desejo, velado, é de vê-lo morto enquanto aguarda na fila.
Uma raiva despropositada contra uma pessoa que sequer é mais presidente.
Alegam, também, que Lula estaria capitalizando politicamente a doença. Deve-se, pois, indagar: de que forma exatamente o Lula estaria fazendo "uso político descarado" de sua doença? Pela mera repercussão midiática do fato ou ele está pedindo votos para alguém?
Se a resposta for a repercussão, questiona-se se algum ser com um mínimo de racionalidade seria capaz de sinceramente considerar que o fato de um ex-presidente estar em tratamento de câncer deve ser escondido da imprensa. Aliás, seria possível esconder esse fato num mundo paparazzis e celebridades instantâneas sedentas por fofocas e intrigas?
Num país em que a imprensa é livre e publica o que quer, cabe supor que está sendo ingênua e manipulada por Lula? Logo ele, o “burro”, o “inculto”, o “manipulado pelos intelectuais”? Logo essa mídia que o detesta?
Se a imprensa resolve publicar e Lula eventualmente acaba por "lucrar politicamente" com seu câncer, ele pode ser responsabilizado por isso? Ele é culpado por ter câncer?
Responda-me, quem puder, como seu tivesse seis anos de idade: se o FHC tiver um câncer, ninguém irá ficar sabendo? Ou o Serra, ou o Aécio?
A pessoa que defende isso e participa do movimento de fato age assim seriamente, numa atitude pensada, refletida, ou se trata de ideia figadal, vinda do raciocínio elaborado pelo ódio e pela intolerância?
O desejo de Lula morto, embutido nas supostas pretensões de que ele seja atendido pelo SUS (o que também embute preconceito contra o SUS), revela indisfarçável fascismo, a ideia do inimigo sem voz, de preferência morto e escorraçado.
Uma coisa é não gostar de um político de expressão, como o FHC ou o Serra. Outra é adotar uma postura obsessiva de atacá-lo por motivações que não inclinam a atacar outros pelo mesmo motivo e da mesma forma virulenta. Ataques, aliás, de extrema infantilidade: "Vá pro SUS", "Vá pro SUS", bradam as crianças birrentas, como se tivessem descoberto uma grande falha de caráter da pessoa que busca apenas a própria cura de uma doença maligna.
Essa atitude é que é, de fato, utilizar a doença do Lula para o benefício político das próprias ideias.

Parecem crianças birrentas, mas são adultos malignos.

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