quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A crise do capitalismo


O capitalismo atravessa uma grave crise e terá um enorme desafio a enfrentar. Um dos vetores dessa crise é a circunstância paradoxal de que, se por um lado o desenvolvimento tecnológico provoca aumento na produtividade, por outro provoca a redução do número de empregos ao tornar supérflua considerável parcela da mão-de-obra. O que antes uma fábrica produzia com 100 trabalhadores, hoje produz o dobro com um terço ou menos disso. Sem emprego, não há renda, as vendas se retraem, a maior produtividade perde o sentido.
Ao lado disso, evidencia-se que alcançamos, ou talvez até já tenhamos ultrapassado, o limite da irresponsabilidade no que toca à exploração do meio-ambiente. Se quisermos garantir o nosso futuro e o das próximas gerações, teremos que aprender a prosseguir no desenvolvimento humano a partir de uma matriz econômica quase completamente isenta de carbono e com redução extrema da extração de recursos naturais. Os economistas ecológicos denominam isso de descasamento relativo ou absoluto, o que significa que teremos que aprender a extrair muito pouco e aproveitar ao máximo, cem por cento se possível, do que for extraído, com reaproveitamento de materiais através de reuso e reciclagem.
Um outro elemento, importante, da crise, é o fato de que a população humana, embora tenha reduzido o ritmo do crescimento, não parou de crescer e provavelmente não irá parar ainda pelos próximos quarenta anos, prevendo-se uma população superior a nove bilhões de pessoas em 2050. Mais gente na Terra implica a necessidade de uma fonte de renda para cada uma dessas pessoas.
Diante de tantos desafios, não mais é possível a manutenção de um sistema econômico fundado no crescimento econômico eterno e na possibilidade de apropriação infinita da riqueza por um pequeno grupo de indivíduos em detrimento de bilhões de outras pessoas, que vivem, ou na miséria absoluta, ou em suas cercanias. Se o mundo é finito, se o sistema ecológico é finito, tudo quanto neles está e deles depende deve ser igualmente finito, inclusive a quantidade de habitantes, a economia e a acumulação de riqueza.
O capitalismo terá que evoluir como sistema para que possa se manter vivo. Não se sabe no que se transformará ou, se for extinto, qual o modelo econômico que o sucederá. Há um receio difuso, e um tanto desarrazoado, de que venha o comunismo. O receio decorre muito mais de um efeito "lenda urbana", como a obrigação de compartilhar a própria casa com estranhos, do que por razões racionais.
Caso se mantenha o capitalismo, no mínimo seremos obrigados a trocar a obsessão pelo crescimento do PIB por algum tipo de medição de prosperidade efetuado a partir de uma análise do desenvolvimento humano, da felicidade e da realização individual.
O consumismo irrefletido terá que ceder lugar a um consumo mais racional, baseado em necessidades reais e não em superfluidades de ostentação. Hoje, consome-se a "novidade" como se fosse um gênero de primeira necessidade. Considerado símbolo de status, o bem é adquirido como símbolo do próprio valor individual. Sem o símbolo à mostra e exibido, não se é nada. Isso terá que mudar. Teremos que voltar a valorizar a pessoa pelo que traz dentro de si, por suas ações.
Um capitalismo mais sadio, de baixo impacto ambiental, deve passar a valorizar a criação de empregos no setor de serviços e de lazer, cuja pegada ecológica quase nula.
Creio que um novo modelo capitalista deverá observar algumas regras para diminuir a pressão sobre o sistema ecológico e para permitir que o mercado, ainda que reduzido, dê conta da sustentabilidade. Isso somente será possível se houver um grande número de pessoas com aptidão para o consumo racional.
Não sou economista, mas de maneira bastante superficial, acredito que algumas dessas novas regras deverão estar próximas das seguintes:
1 - Redução da variação e da disparidade de valor nas classes de renda de uma mesma empresa, como, por exemplo, obrigá-las a terem, no máximo, dez classes de salários diferentes, sendo o mais alto com valor equivalente a, talvez, cinco vezes o mais baixo;
2 - Universalização da participação dos empregados nos lucros;
3 - Redução da jornada de trabalho para quatro ou cinco horas diárias, em quatro dias da semana;
4 - Proibição ou criação de dificuldades para a prestação de horas extraordinárias pelos trabalhadores, o que poderia ser realizado através da imposição de adicional mínimo de 100%;
5 - Fixação de pesada indenização compensatória pela dispensa sem motivação, no modelo do que existe no Brasil em relação ao percentual que incide sobre o FGTS, porém mais elevado, e também com tempo do aviso prévio maior do que prevê a legislação brasileira e com acréscimo relevante de dias para cada ano trabalhado;
6 - Concessão de vantagens tributárias às empresas proporcionalmente ao número de empregos que criarem;
7 - Extinção total do mercado mobiliário meramente especulativo, como os derivativos, somente admitindo negociação em bolsa de papéis efetivamente vinculados à economia produtiva, com valor definido pelo real valor do negócio;
8 - Redução ao mínimo da venda de títulos públicos, bem como dos juros pagos por sua aquisição;
9 - Aumento substancial da tributação sobre as grandes receitas, físicas ou jurídicas;
10 - Redução substancial dos direitos de herança;
11 - Estímulo drástico à criação de pequenas e médias empresas, abolindo ou impedindo a formação de grandes conglomerados;
12 - Estímulo severo ao comércio regionalizado, interno e externo.
Essas medidas, ou algo próximo, seriam capazes de permitir o surgimento de um novo tipo de capitalismo, mais verde, com menor impacto ambiental e socialmente mais justo.

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